sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

Capítulo 01

"Me ajude, estou aguentando firme pela vida
Não vou olhar para baixo, não vou abrir os meus olhos
Vou deixar o meu copo cheio até de manhã
Porque estou aguentando firme hoje à noite
Aguentando firme hoje à noite."
- Sia: Chandelier

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 "Creio que olhes por mim ai de cima, de alguma forma sei que está. Todas as nossas conversas, lembranças ficaram no meu coração como uma tatuagem que jamais pretendo esquecer. Você se foi. Sem se despedir, sem me dizer adeus e presumo que talvez tenha sido melhor assim. A dor está maior a cada dia e sem você meu caro John, a minha vida não tem graça alguma.
 Continuo viva nesse mundo insano pois tu não gostaria de me ver de tal forma por tua causa. Tua presença se encontra nesse apartamento, teu cheiro, tuas roupas estão todas aqui. O estranho é que agora não iremos nos ver e nos embebedar em uma sexta a noite, não iremos ao parque todas as quintas nem sequer ir ao cinema as segundas só porque está mais barato o bilhete. 
 O caro John, se soubestes quanta falta me faz, o quanto eu devo minha vida a ti e o quanto eu gostaria que fosse a mim e não tu no meu lugar. Mas creio que, como o bombeiro disse "Que nem sempre todas as rosas são rosas, porque Deus é quem sabe de tudo e as vezes os anjos vem e os anjos vão" e como um anjo você se foi, com sua fé inabalável, com sua auto confiança em si, sua sabedoria, sua vontade inexplicável de conhecer o mundo, ler todos os livros possíveis e comer na lanchonete a frente quando perdesse a vergonha e o medo de dizer a moça o quanto achavas ela linda e chamá-la para sair.
 Obrigada meu caro irmão, amigo John por tua fé, por tua vontade de viver e por tua vida que agora se foi. Serás sempre lembrado por mim, nossos únicos momentos juntos estão sempre comigo e sempre vou lhe amar. Obrigada caro John, por tua presença, sua jornada acabou, mas a minha de algum modo continuará."
[...]
5 meses depois
Atlanta, 11:30 p.m Terça-feira.
 Adentrei apartamento a dentro jogando minha bolsa no sofá, me dirigindo até a geladeira, pegando a jarra de vidro que contia água dentro, me esquivei e peguei o copo de vidro á cima do balcão. Voltei para a sala, peguei a primeira cadeira a minha frente, me sentei frente a enorme janela de vidro daquele apartamento e assim, puis-me a olhar aquela enorme cidade de Atlanta e pensar como seria minha vida agora pra frente. 
 Como, como seguir minha vida sem meu único irmão que agora se foi. Perder o irmão é como tirar parte de si e jogar no lixo, é pior que a dor do amor, pior que a dor da perda creio que não existe algo substituível.
 Meu telefone pois-se a tocar, levantei-me cuidadosamente e me encaminhei até a cozinha para atender.
- Alô?
- Querida.
- Mãe.-
- O meu amor, eu sinto muito.-Disse em meio as lágrimas.
- Eu também sinto muito mãe.
 John era meu irmão por parte de pai, sua mãe morreu logo após ele nasceu. Anos após minha mãe se casou com meu pai e eu nasci, John sempre cuidou de mim, minha mãe tem sua marca de roupas em Los Angeles, meu pai é piloto então fica fora de casa quase sempre. Quando eu completei 18 anos, John e eu decidimos nos mudar para Atlanta para conseguirmos um futuro melhor, se é que se pode dizer isso quando se tem pais milionários. 
- Seu pai quer que venha morar conosco.
- Não obrigada.
- Querida você não pode ficar nessa cidade nesse estado.
- Mãe, podemos conversar sobre isso depois? Preciso descansar hoje o dia foi exaustivo.
- Okay querida, qualquer coisa nos avise. Estaremos aqui sempre, amamos você.
- Também te amo mãe.- Fim da ligação.
 Meus pais nunca foram pais presentes para dizer a verdade, minha raiva é o fato de o filho deles terem morrido e ele não virem sequer no velório por conta de dinheiro, empresa e todas essas merdas que fazem o mundo pior a cada dia. E agora todos eles querem que eu volte, para ficar olhando para cara deles com pena de mim todos os dias. Meu dizendo o quanto preservar a imagem é importando e minha mãe me dando dicas de moda. Ficas aqui onde estou, em meio a minha dor, em meio a um lugar onde me recordo de lembranças boas, onde me faz bem e me faz sentir segura de todo o mundo lá fora é melhor.
 Fui até meu quarto, tomei um banho demorado, sequei meus cabelos e me arrumei. Uma roupa confortável para mim. Como hoje é terça, decidi ir ao bar da esquina logo aqui perto para distrair minha mente. Talvez o apartamento esteja me sufocando e hoje é um daqueles dias a qual eu desejo sair e não voltar tão cedo para casa e se acaso volte, não me lembre de nada.
 Tranquei a porta, caminhei lentamente até as escadas. Devo ressaltar que tenho pavor de elevador, locais muito fechado isso me deixa nervosa, começo soar frio e acabo tendo mais um daqueles ataques de asma, coisas de uma problemática como sempre digo. Três, dois e por fim estou na portaria do prédio.
- Boa noite Mark.
- Boa noite Elena, como foi o dia?
- Normal -pausa- noite movimentada?
- Para uma terça a noite sim.
- Sabes como é está cidade, sempre movimentada.
- Eu que o diga Elena.
- Até mais tarde.
- Até, vá com Deus moça.
 Deixei o bom e velho Mark na portaria e caminhei calmamente até o bar da esquina, sentei-me na mesa de madeira velha por sinal, puis minha bolsa em cima da mesma, cruzei minhas pernas e logo vi se aproximar um rapaz ruivo de olhos claros se aproximar, vestindo um avental preto, com o cardápio em mãos.
- Boa noite, o que a senhorita gostaria?
- Um Whisky por favor.
- Mais alguma coisa?
- Por enquanto só.
- Um momento.
- Okay.
 Não demorou muito para que minha dose chegasse, bebi sem êxito e logo pedi mais uma e outra, outra. Enquanto bebia, reparava nas pessoas passando por aquela rua, casais, famílias, grupo de amigos, mendigos e me perguntando "Será que são realmente felizes?". Creio que não sou deste mundo, não vejo tudo como todo mundo vê, que tudo é belo e todos serão felizes um dia, enxergar em pequenos detalhes como tudo é belo -até porque não é- e as pessoas temem em passar por cima da realidade e poluir suas mentes com a ilusão a qual as fazem felizes e pressuponho que eu não sou assim, encaro as coisas como elas são e não, não pense que sou assim só porque perdi meu melhor amigo.
"- Você não pode continuar com isso Elena, tem que para com essas paranoias dentro de si.
- Você quem não vê como esse mundo é horrível, cruel e idiota John. PARE DE VER TUDO COM ESSA ALEGRIA, COM ESSA BONITEZA PORQUE AS COISAS NÃO SÃO ASSIM!-Me alterei.
- Você precisa de cuidar Elena, continuar assim não dá -lágrimas caíram sobre seu rosto- como posso conviver com você se cortando, bebendo descontroladamente e assim sem nenhuma expectativa de vida.
- Eu não preciso de tratamento John, você quem precisa entender que o mundo não é esse conto de fadas.
 Ele me abraçou, tão forte que derramei em lágrimas, chorei como uma criança e o abracei mais forte ainda pois precisava daquele abraço e sabia que ele seria o único a me confortar em momentos como este. 
- Eu não aguento mais esta vida John, eu não aguento mais.-Disse me meio aos prantos.
- Vamos superar isso juntos, eu vou estar com você sempre -ele tocou meu rosto, me fazendo olhá-lo nos olhos- entende? -confirmei com a cabeça- sempre."
 Eu só tinha que entender que o "sempre" sempre se acaba e que eu precisava sim de um tratamento, mas John foi meu único remédio, meu único tratamento e nele -meu único e verdadeiro amigo, irmão- eu renovei minhas forças. Em meio a sua doença ele nem sequer se tocou de que precisava de ajuda e fez de tudo para me ajudar, para me ver bem e quando me recuperei, ele se foi. 
 O mundo é uma droga justamente por essas facadas que a vida lhe dá sem ao menos avisar, a gente sofre, renova suas forças para sofrer novamente e da pior forma possível e como John dizia"Deus não da farda pra quem não será capaz de ir a luta". 
8 meses depois
Atlanta, 09:40 p.m
Quando dei por mim, eu me encontrava dormindo no banco de uma praça, com apenas um um casaco velho rasgado. Resumo que com o passar do tempo eu me acabei na bebida, abandonei meu serviço, fui despejada e tudo que tinha era apenas a roupa do corpo e um casaco que roubei do bazar enquanto a moça não notava minha presença ali. 
 A cada gole da bebida, meu estômago doía como uma cólica menstrual insuportável que eu rolava no chão de dor, cheguei a um ponto em que bebia e vomitava, a bebida era meu único alimento agora. Não tomo banho a algum tempo, minhas unhas estão encardidas, meu cheiro insuportável e minha fome maior que minhas forças.
 Caminhei lentamente pelo centro da cidade a procura de comida,um pedaço de pão apenas e então vi que as pessoas não pensam no próximo apenas em si mesmas. Ouvia comentários como "Vai trabalhar", "Invés de ir trabalhar, vem pedir do dinheiro do próximo" mas mesmo assim não desisti.
 Avistei uma loja em minha frente, uma moça bonita por sinal se sentava ali, olhando-se no espelho retocando a maquiagem. Adentrei loja a dentro, olhei tudo aquilo ali e parecia ser uma daquelas lojas caríssimas de marca onde apenas loiras siliconadas trabalham pra chamar atenção do cliente.
- O que faz aqui? Não há nada de que possa comprar nesse estabelecimento.
- Vocês tem, algum resto de comida ou de café da manhã pra me dar um pouco? Não como a dias.- A loira gargalho, logo a loira 2 se aproximou me olhando com nojo de cima abaixo.
- Ela quer resto de comida Mallody -pausa- querida acha que aqui é algum daqueles lugares onde se dão comida de graça? E acha que esse papo de não como a dias funciona aqui? Vá trabalhar e para de querer o que é dos outros.
- Me desculpe, mas realmente estou com fome.
 Dei meia volta, caminhei em passos longos agora, minha vontade é correr e abraçar John e me proteger do mundo, mas me recordei de que não tinha mais John então lágrimas rolaram sobre minha face descontroladamente, abri porta a fora e me esbarrei em alguém. Olhei para um rapaz de olhos castanhos, cabelo loiro, tatuado parado em minha frente.
- Perdão, sou um desastre.
- Por que choras?
- Oh, nada demais.
- Por que está tão suja? Descalça?
- Porque talvez more na rua.- O rapaz me encarou por alguns minutos. Ah Elena o que ce ta fazendo? Vai embora, anda, você tá perdendo tempo aqui.- Adeus.- Me virei, o mesmo tocou meu braço, me virei, a manga subiu mostrando meus pulsos inteiramente fundos, cortados. Um momento constrangedor para ambos, o encarei completamente sem saber o que fazer, o que dizer ou que ação tomar.
- A quanto tempo não come?
- 7 dias.- Ele me olhou  assustado, ainda sim olhou para o meu braço.
- Está se machucando, não pode continuar com isso.
- Se sua intenção é me dizer que preciso de ajudar, que preciso de um tratamento psicológico peço que me solte -me soltei de suas mãos.
- Mas você precisa.
- Eu vim atrás de comida, não de ajuda.
- Talvez você precise dos dois.

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